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Programa Renda e Oportunidade de Bolsonaro: novas medidas não vão auxiliar o trabalhador, diz advogado da LBS

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Programa Renda e Oportunidade

A história não é incomum: em pleno ano eleitoral, um governante lança um programa social que pode auxiliá-lo a ganhar a disputa. Contudo, no caso do Programa Renda e Oportunidade a situação pode ser ainda mais grave. Isso porque, conforme aponta o advogado Antonio Megale, sócio da LBS Advogados, as ações criadas "não são oportunidades para os trabalhadores".

Feito por meio de Medidas Provisórias (MP), sem um planejamento abrangente e sem o debate no Congresso Nacional, o Renda e Oportunidade pode gerar problemas graves para o seu público alvo. Acompanhe a explicação do advogado em entrevista ao Reconta Aí.

Reconta Aí: As Medidas Provisórias (MP) que compõem o Programa  Renda e Oportunidade não parecem ter sido pensadas conjuntamente para a formação de um programa coeso, o que elas têm em comum?

Dr. Antonio Megale - Sim, as Medidas Provisórias nº 1.105; 1.106; 1.108 e 1.109 e do Decreto nº 10.999, que compõe o chamado “Programa Renda e Oportunidade” objetivam, segunda o governo, alavancar a retomada do emprego e da economia no país, com geração de renda e aumento do poder de compra dos brasileiros, especialmente entre os de menor renda.  Será? Eu perguntaria: esse Programa Renda e Oportunidade cria oportunidade para quem?

Reconta Aí - O sr. poderia explicar em palavras simples as mudanças que cada uma das MPs implementam?

Dr. Antonio Megale - A MP nº 1.105 permite o saque extraordinário do FGTS de até R$ 1.000,00, até 15/12/22. O alegado objetivo é reduzir o comprometimento da renda e endividamento das famílias em função da crise sanitária provocada pela Covid-19. O problema é que o FGTS está sendo desvirtuado mais uma vez e, quando o trabalhador precisar dele, não terá o valor total depositado.

A MP nº 1.106, por sua vez, amplia a margem de empréstimo consignado dos atuais 35% do valor do benefício de aposentadoria e pensão para até 40%, além de incluir o empréstimo consignado também aos beneficiários do (BPC) ou do Auxílio Brasil. A ampliação, na verdade, causará o endividamento e o comprometimento da renda das famílias em condições de vulnerabilidade.

A MP nº 1.107/22 institui o Sim Digital – Programa de Simplificação do Microcrédito Digital.

A MP nº 1.108 altera disposições na legislação trabalhista sobre o auxílio-alimentação e o teletrabalho. As alterações dessa MP, diferentemente das demais, trazem mudanças de forma permanente na legislação trabalhista.

A MP inclui dispositivo na Lei nº 6.321/76, que trata da dedução, do imposto de renda das empresas, das despesas realizadas em programas de alimentação do trabalhador. A interpretação do novo parágrafo pode abrir brecha para a exclusão do benefício fiscal do PAT às empresas que produzem e fornecem refeições em seus próprios refeitórios.

Quanto ao teletrabalho, há também modificações significativas.

Reconta Aí - E quais são?

Dr. Antonio Megale - A MP restringe a aplicação do art. 62 da CLT, que excepciona o registro da jornada de trabalho apenas para os empregados em regime de teletrabalho que prestam serviço por produção ou tarefa. Antes, a previsão legal abarcava todos os trabalhadores em teletrabalho, independentemente de como eram desempenhadas e entregues as atividades.

Logo, há agora dois tipos de regime de jornada para o teletrabalho: um com jornada de trabalho, que é caracterizado por controle de ponto e pagamento das horas extras; outro sem jornada de trabalho, por produção ou tarefa. O salário por produção ou tarefa é regulamentado no art. 78 da CLT, pago diariamente por empreitada, tarefa ou peça, com garantia do salário-mínimo.

Apesar de a MP restringir a aplicação de controle de horário no teletrabalho para os serviços por produção ou tarefa, considerando os recursos tecnológicos de fiscalização das atividades, é possível ao empregador controlar a jornada de trabalho e tal restrição pode estimular a adoção de produções ou tarefas em grande volume, acarretando jornadas de trabalho exaustivas.

Por fim, a MP nº 1.109/22 traz mudanças na legislação em decorrência nas situações de estado de calamidade, com mudanças no teletrabalho, possibilidade de antecipação de férias individuais e coletivas, aproveitamento e antecipação de feriados, banco de horas, suspensão da exigibilidade dos recolhimentos do FGTS, suspensão dos contratos de trabalho, redução da jornada e do salário, pagamento do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda, mas tudo a critério do empregador, sem participação dos trabalhadores e dos sindicatos.

Reconta Aí - No que as medidas anunciadas auxiliam os trabalhadores?

Dr. Antonio Megale - Não auxiliam.

Reconta Aí - E em que elas podem prejudicar os trabalhadores?

Dr. Antonio Megale - Os trabalhadores poderão ter jornadas de trabalho exaustivas, por exemplo, mesmo que as empresas possam controlar suas jornadas por meios tecnológicos. A possibilidade de se trabalhar por produção ou tarefa não respeita a saúde dos trabalhadores.

Pela MP nº 1.109, os trabalhadores poderão ter férias individuais e coletivas antecipadas, sem receber o 1/3 de férias, por exemplo. Poderão, ainda, ter seus contratos de trabalho suspensos ou a jornada e salários reduzidos, em caso de calamidade a qualquer tempo, reconhecida pelo governo federal. Na verdade, a MP traz situações excepcionais tomadas na época do auge da pandemia para qualquer tempo.

Reconta Aí - A injeção de dinheiro na economia neste momento parece benéfica, principalmente para os mais vulneráveis. Ainda assim, o senhor aponta que ela pode ter finalidade eleitoral, pode dizer por quê?

Dr. Antonio Megale - As medidas evidenciam sim o intuito eleitoral do governo, que tenta injetar dinheiro na economia às vésperas das eleições, sem qualquer planejamento e diálogo social, deixando de resolver os verdadeiros problemas da população mais vulnerável. Haverá, sem dúvida, sensação de dinheiro no bolso do trabalhador, quando ele, por exemplo, sacar seu FGTS ou conseguir empréstimo com margem maior. Mas isso resolve? E quando ele efetivamente precisar dos valores de FGTS, quando demitido ou para financiar um imóvel? É falsa a sensação de dinheiro no bolso e passageira também.

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