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O que são os precatórios que Bolsonaro quer utilizar para financiar o Renda Cidadã?

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O governo Jair Bolsonaro afirmou que pretende lançar o Renda Cidadã, reformulação de programas sociais herdados de gestões passadas, tendo como fontes de financiamento recursos vindos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e dos destinados ao pagamento de precatórios.

Mas afinal, o que são precatórios? Bolsonaro poderia utilizar dinheiro destinado ao pagamento destes para financiar um programa social?

Precatórios são pedidos judiciais feitos por pessoas jurídicas ou físicas para que o poder público pague dívidas. Por exemplo: quando a União tem uma dívida com alguém e não paga, o precatório é um método de realizar essa cobrança. Como o próprio Estado tem de reservar dinheiro para o pagamento destas dívidas que são cobradas na Justiça, há uma enorme fila para que elas sejam quitadas.

E por isso, em tese, Bolsonaro não poderia utilizar esse dinheiro para financiar o programa Renda Cidadã.

“A Lei de Responsabilidade Fiscal [LRF] exige que a criação de uma despesa permanente seja acompanhada da criação de uma compensação igual permanente. Seja pelo lado das receitas ou pelo lado das despesas”, diz David Decache, doutorando em Economia na UnB.

Em outras palavras: para criar uma despesa sem prazo para acabar – caso do Renda Cidadã – o governo precisa indicar qual é a fonte de onde virá o dinheiro. Ou ele vem através do corte em outro gasto, ou através da elevação da arrecadação de tributos.

Como o dinheiro disponibilizado para o pagamento de precatórios fica sob gestão da Justiça, esta não é uma fonte permanente à disposição do Executivo, como exige a Lei: “Estão empurrando com a barriga no curtíssimo prazo, não depende de ato discricionário do governo, depende de como o Judiciário reagiria a isso. Não seria uma fonte permanente”, afirma Decache.

Alternativas ao precatório

O governo poderia então aumentar tributos para financiar o Renda Cidadã? Não, por conta da Emenda do Teto de Gastos.

“Por conta do Teto de Gastos, não há a opção de compensar pelo aumento de receita através de tributação. O Teto impede que se aumente alguma despesa, mesmo com aumento da carga e da arrecadação. O Teto congela as despesas, mesmo com equilíbrio fiscal”, explica o economista.

A “manutenção ideológica do Teto”, portanto, exigiria “cortar em outro lugar”. Assim, o descongelamento de despesas seria, na opinião de Decache, fundamental.

“O caminho seria revogar o Teto e, em se mantendo a LRF, simplesmente criar algum tipo de tributação, como sobre os lucros e dividendos”, defende. “Uma reforma tributária que cobre dos mais ricos, evitando o conflito entre os pobres e os miseráveis no Orçamento”.

Para Decache, o anúncio de Bolsonaro revela a incoerência dos que defendem uma visão ortodoxa do regime fiscal: “Dilma caiu por uma avaliação muito mais questionável”.

“A nossa legislação fiscal é instrumentalizada por fatores políticos. A interpretação da lei é, antes de tudo, política. Há uma incoerência dos que outro dia  defendiam a ideia de crime de responsabilidade, de forma altamente questionável, e hoje defendem uma pedalada fiscal que é explícita”, critica.

A mesma visão rígida da política fiscal, em sua avaliação, leva à proposição de se retirar dinheiro da educação para viabilizar o programa.

“Não há sentido. Bastaria que o dogmatismo fiscal fosse reformulado para permitir que o financiamento do Renda Básica funcionasse como funcionou o auxílio emergencial, sem tirar dinheiro de lugar nenhum. Poderia financiar com uma política deficitária ou com a elevação de tributos sobre os mais ricos, sem cortar de nenhuma outra área”, finaliza.