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CPI da Covid: Indígenas cobram investigação do Governo Federal por genocídio

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Reunião Indígenas e Omar Aziz

Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

O Conselho Indígenista Missionário (Cimi), órgão de defesa indígena ligado à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entregou ao presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD/AM), um dossiê sobre a disseminação da covid-19 entre os povos indígenas do Amazonas e região.

O documento - entregue nesta terça-feira (20) - foi organizado pela Frente Amazônica de Mobilização em Defesa dos Direitos Indígenas (FAMDDI) e pede que os fatos apresentados sejam incluídos no relatório final, para que sejam "apuradas todas as responsabilidades e encaminhadas aos órgãos competentes a fim de que sejam promovidas as ações cabíveis para responsabilização criminal e administrativa dos agentes”. 

Além do Cimi e da FAMDDI, apoiam o relatório a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Amazonas (SJPAM), a Associação dos Docentes da Universidade Federal do Amazonas (Adua) e outras organizações indigenistas.

Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

O que diz o dossiê

O documento revela uma série de denúncias de violações de direitos e relatos em primeira pessoa dos indígenas que sofreram ações e omissões de diferentes organismos governamentais que culminaram com a morte de quase 1 mil indígenas no Brasil.

O dossiê ainda reafirma que o crime de genocídio foi praticado pelo Estado contra os povos originários do Brasil.

Repercussão

A deputada Joenia Wapichana (Rede/RR), única parlamentar indígena na Câmara dos Deputados e coordenadora da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas, afirma que existe "uma pressão muito grande para tirar a configuração de genocídio do relatório da CPI". Contudo, a parlamentar afirma que as informações contidas no relatório mostram que o crime está claro.

"Eu espero que a CPI aja com coerência e todas as discussões acumuladas e documentos que receberam ajudem a configurar todos os crimes que Bolsonaro praticou", explica a parlamentar.

José Ricardo (PT/AM), vice-coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas, completa: “Esse relatório da FAMDDI é muito grave. São quase 1 mil indígenas mortos e milhares que ainda sofrem as consequências da covid, com a falta de assistência, falta de segurança e isolamento por parte do poder público. Nesse documento, há relatos de várias situações graves envolvendo os povos da região Amazônica, que a FAMDDI chega a chamar de tentativa de extermínio. Não podemos ficar calados frente a esses descasos e cobramos responsabilizações”. 

Omar Aziz responde

O presidente da CPI, Omar Aziz reafirmou a importância do tema e explicou que a CPI da Covid criou uma subcomissão para acompanhar as investigações do Ministério Público sobre o tema. E ainda reafirmou a importância de "cobrar das autoridades e instituições que as providências sugeridas sejam implementadas". Entretanto, não garantiu que o crime de genocídio constará no relatório final, como de fato não constou na proposta apresentada ontem (20) pelo relator Renan Calheiros (MDB/AL).

 Porém, as entidades indigenistas ainda aguardam uma reunião presencial com Renan Calheiros para tratar do tema.

Os relatos dos indígenas sobre como o poder público lidou com a pandemia nas aldeias e nas cidades

De acordo com a liderança Yanomami da Associação Yanomami Kurikama da região do rio Negro (AM), toda sua aldeia está doente, seja pela covid-19, seja pela malária. Ela ainda relata que há descaso da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) em relação à invasão de garimpeiros nas terras Yanomamis.

“A nossa saúde não está bem. A Sesai tá devagar. Por isso tá cheio de malária. Todos na comunidade estão doentes. Hoje temos Covid 19. Já pegamos… Já morremos… Precisamos acabar… Precisamos vacinar…”

liderança Yanomami da Associação Yanomami Kurikama

Assim como a liderança Kanamari, que relata que a região com maior concentração de povos isolados do mundo, a Terra Indígena Vale do Javari - na fronteira entre Brasil e Peru - está suscetível à contaminação por covid-19 por causa do grande afluxo de invasores no território.

“Os invasores – garimpeiros, madeireiros, caçadores e pescadores – agem com total liberdade. Eles são encorajados pelo Governo Federal e pela fragilização do sistema de proteção de índios isolados da Funai. A situação é ainda mais crítica com a propagação da covid 19 em todo Vale do Javari, o que pode provocar o genocídio dos parentes isolados.”

liderança Kanamari

Um dos mais graves relatos vem da liderança Kokama, no alto do Solimões:

“O médico estava de férias e quando voltou estava contaminado com a Covid e infectou a agente de saúde da Aldeia São José, que foi a primeira indígena infectada na aldeia. E a doença se espalhou muito rapidamente, sem controle, sem medidas de proteção e sem atenção dos governos. Assim, nosso povo continuou morrendo aqui no Alto Solimões. É muito difícil ver o seu povo sendo enterrado em valas, em sepultura coletiva. E ainda tem algo muito sério porque meu povo ainda é enterrado como pardo. O que é pardo? Eu e meu povo não somos pardos, somos Kokama, somos povo originário. Mesmo assim, a gente briga todo tempo para que no atestado de óbito conste como indígena Kokama”.

Com informações do Cimi.