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Consórcio do Nordeste e Governo Federal - o Drama da Segurança Pública

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Em tempos de guerra, a sensibilidade à violência aumenta. Imagens e narrativas de horror e morte inundam a mídia. Não interessa a distância do evento, as pessoas se sensibilizam – e se mobilizam – para protestar e pedir o fim do sofrimento. Na verdade, quanto mais distante a dor, maior a sensibilidade. A tragédia em Petrópolis, por exemplo, perdeu espaço e importância junto à solidariedade dos cidadãos espectadores. Mesmo que em quatro dias de guerra o número oficial de mortos não ultrapassasse os soterrados na cidade fluminense. E as mortes violentas no Brasil apresentam números que superam muitos conflitos pelo mundo.

Os brasileiros convivem bem com números de guerras. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado em 2021 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), tivemos 50.033 registros de mortes violentas em 2020, um número 4% maior do que em 2019 (47.742). Vale lembrar que os números de 2019 foram comemorados, já que em 2018 foram 57.574 mortes violentas. A região Nordeste havia liderado esse aumento.

Chegando a 2021, o número foi o mais baixo desde 2007: 41.069 assassinatos. E foi justamente a região Nordeste liderou essa queda. Se o Brasil teve 3.049 mortes violentas a menos do que no ano anterior, o Nordeste teve 1.945 mortes a menos. Dois terços da redução se deveram à região.

A subida dos números em 2020 pode estar diretamente relacionada ao recorde de compra de armas de fogo. Foram 186.071 novos registros, um aumento de 97,1% em relação a 2019. Também mais que dobraram (aumento de 108%) a autorização de importações de armas de fogo como carabinas e fuzis. E os registros de colecionadores, caçadores e atiradores desportivos apresentou uma alta de 29,6%. No total, em julho de 2021, o País registrava 2 milhões de armas particulares. A flexibilização no acesso a armas, a fragilização do controle e do rastreamento de armas se deu a partir de 2019. E os números da letalidade policial só aumentaram entre 2013 e 2020.

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A diminuição das mortes violentas não teve o dedo ou a colaboração do Governo Federal. Pelo contrário, este apenas facilitou o maior número de armas de fogo nas mãos de civis e criou um clima de glorificação da violência policial. Mas o caso nordestino é digno de nota. Lembrando que as taxas do Nordeste de homicídios são as mais altas do País.

A criação do Consórcio Nordeste em 2019, com os nove estados da região, ações integradas foram planejadas e implementadas em diversas áreas. Criou-se a força de Segurança Integrada dos Estados, coordenada pelo Estado do Piauí, que reuniu secretários de Segurança e de Justiça, os delegados gerais, comandantes das polícias, bombeiros e responsáveis pelo sistema carcerário. Implantou-se ainda, com sede em Fortaleza, um Central de Inteligência, que mostrou melhores resultados no combate ao crime organizado. Processos de qualificação de pessoal, viaturas e equipamentos novos, sistemas de inteligência integrados são a base desse trabalho. O Piauí, por sinal, liderou a queda das mortes violentas na região. A falta de controle de armas e drogas na fronteira é uma das maiores dificuldades relatadas, o que denota mais uma vez a ausência do Governo Federal e de um plano nacional nessa área.

Estamos habituados a números de guerra em nossos homicídios diários, mas o tema da segurança sempre é importante eleitoralmente. Hoje temos duas visões opostas para a resolução do problema. De um lado, o incentivo ao armamento civil, as tentativas desesperadas de liberação para a aquisição de armas e de dificultar o rastreamento das mesmas, além do estímulo à beligerância por parte de cidadãos e policiais. Do outro lado, planejamento, inteligência e diálogo para determinar estratégias de combate ao crime e de ações policiais.

Os resultados parecem claros, mas como alcançar o convencimento de uma sociedade que convive com a violência há anos, sob uma mídia que glorifica a tese do “bandido bom é bandido morto”, sob tempos em que sentimos que a violência e a morte estão em outro continente?