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Artigo – Mercado de trabalho após a Reforma Trabalhista

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Alardeada como solução para o mercado de trabalho, a Reforma Trabalhista foi implementada. Mas, o que foi prometido? O que esta sendo entregue?

O mercado de trabalho não melhorou após a reforma trabalhista.Imagem: https://www.reportermaceio.com.br/

Decorridos dois anos de vigência da Reforma Trabalhista, cabe fazer um balanço inicial de suas promessas e resultados concretos. É o que se pretende fazer nessa série de três artigos da doutora em economia Regina Camargos, que serão publicados no Reconta Aí.

Reforma Trabalhista: recontando o debate

A reforma trabalhista começou a ser discutida no Brasil na década de 1990, no contexto da abertura econômica e do debate sobre “Estado Mínimo”.

Na época, alguns acadêmicos 1 e consultores empresariais argumentavam que o aumento do desemprego, verificado desde o final da década de 1980, decorria da rigidez da legislação trabalhista e dos elevados “encargos sociais”. Esses fatores constituíam um empecilho ao ajuste do mercado de trabalho durante as crises econômicas, retardavam sua recuperação nos momentos de retomada e mantinham sua estrutura dual (formalidade-informalidade).

O início da desregulamentação do mercado de trabalho

Após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, esse debate voltou à tona. A Exposição de Motivos do Projeto de Lei 6.787/16 – que foi o embrião da reforma trabalhista – enviada à Câmara dos Deputados no final de dezembro de 2016 mencionava, entre seus principais objetivos, estímulo à criação de empregos, redução do desemprego e da informalidade.

Esses objetivos seriam alcançados por meio da “modernização” da legislação, entendida como a criação de novos tipos de contratos celetistas – como o intermitente -, ampliação do uso dos contratos a tempo parcial e determinado -, redução dos custos de contratação e demissão e possibilidade de fixação de condições de trabalho inferiores à CLT, via negociação coletiva.

A tramitação da reforma, desde a primeira versão enviada à Câmara dos Deputados até a aprovação final pelo Senado, em julho de 2017, foi acompanhada de intensa divulgação de prognósticos quanto aos seus resultados, considerando os objetivos mencionados.

Analistas de grandes bancos brasileiros, por exemplo, argumentavam que a rigidez da legislação trabalhista deslocava as ocupações para a informalidade, gerava acentuadas desigualdades salariais e impedia que taxa de desemprego caísse mais rapidamente após crises econômicas. Segundo eles, a reforma trabalhista facilitaria a retomada dos investimentos privados após períodos de crise e reduziria, no longo prazo, o desemprego, a desigualdade salarial e a informalidade 2.

De outro lado, críticos à reforma advertiam que a queda no desemprego decorreria essencialmente da retomada consistente do crescimento econômico e que a redução da informalidade dependia de um conjunto articulado de políticas públicas. Os indicadores do mercado de trabalho entre 2004-2014 confirmavam essa visão.

Ao contrário, a flexibilização de aspectos da legislação trabalhista, ocorrida nos governos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, não surtiu efeitos positivos sobre o emprego e a informalidade, pois não foi acompanhada de medidas para estimular o crescimento econômico 3.

Analisando experiências anteriores

Diversos estudos nacionais e internacionais questionam a eficácia das reformas trabalhistas para estimular o mercado de trabalho.

No Brasil, destacam-se as análises dos economistas do CESIT/ Unicamp4, da REMIR5 e do DIEESE6.

Em nível internacional, um estudo divulgado pela OIT em 2017 analisou os impactos de reformas semelhantes em diversos países do mundo. Ele mostra que a taxa de desemprego aumentou quando as reformas foram implementadas durante crises econômicas, mas, nos períodos de crescimento, não favoreceram expressivamente a redução do desemprego 7.

Um outro estudo internacional mostra que as reformas trabalhistas, além de não resolveram os problemas do desemprego, pioraram as condições econômicas no longo prazo, pois comprometeram o crescimento da renda e da produtividade do trabalho 8.

Esses estudos não negam a necessidade de atualizar a legislação trabalhista, pois o mundo do trabalho está passando por grandes mudanças. Entretanto, questionam enfaticamente uma ideia cara aos economistas neoliberais, segundo a qual as reformas trabalhistas são a panaceia que reduzirá o desemprego, a informalidade, a rotatividade e o subemprego, entre outros problemas do mercado de trabalho.

Por fim, esses estudos mostram que as reformas trabalhistas degradaram as condições de vida dos trabalhadores em países economicamente mais desenvolvidos e socialmente mais justos que o Brasil. O que poderá ocorrer aqui onde essas condições sempre foram bastante precárias?

É o que veremos no segundo artigo sobre a reforma trabalhista.

Regina Camargos é Economista, doutora em Ciência Política, especialista em relações de trabalho.

Referências Bibliográficas

1º– PASTORE, J. Flexibilização dos mercados de trabalho e contratação coletiva. São Paulo: LTr, 1994

– CAMARGO, J. M. Flexibilidade e produtividade no mercado de trabalho brasileiro. In: CAMARGO, J. M. (Org.). Flexibilidade do mercado de trabalho no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1996.

2º – DIEESE. Nota Técnica 187, novembro de 2017. Os bancos e a reforma trabalhista. Análise dos estudos divulgados pelo Bradesco, Santander e Itaú BBA. https://www.dieese.org.br/notatecnica/2017/notaTec187bancosReformaTrabalhista.html

3º Entre elas, a adequação da jornada de trabalho aos ciclos produtivos das empresas, por meio do Banco de Horas; vinculação de parcela da remuneração ao cumprimento de metas, por meio da Participação nos Lucros ou Resultados; e ampliação da possibilidade de utilização, pelas empresas, do contrato de trabalho por prazo determinado (Lei 9.601/98), que reduziu os custos da contratação em relação à forma celetista padrão em quase 40%.

4º – Teixeira, M. O; Galvão, A.; Krein, J.D.; Biavaschi, M.; Almeida, P.F. de; Andrade, H.R.de (orgs). Contribuição Crítica à reforma trabalhista. CESIT/IE/Unicamp, 2017

5º – Krein, J. D.; Oliveira, R.V de; Filgueiras, V. (orgs). Reforma trabalhista no Brasil: promessas e realidade. REMIR Trabalho. Rede de Estudos e Monitoramento Interdisciplinar da Reforma Trabalhista. Ed. Curt Nimuendajú. Campinas, 2019.

6º – DIEESE. Nota Técnica 178, maio de 2017. A Reforma Trabalhista e os impactos para as relações de trabalho no Brasil. https://www.dieese.org.br/notatecnica/2017/notaTec178reformaTrabalhista.pdf

– DIEESE. Nota Técnica 179, maio de 2017. Relações de trabalho sem proteção: de volta ao período anterior a 1930? https://www.dieese.org.br/notatecnica/2017/notaTec179ConjunturaReforma.pdf

7º – ADASCALITEI, D.; MORANO, C.P. Drivers and effects of labour market reforms: evidence from a novel policy compendium. IZA Journal of Labor Policy, v. 5, n. 15, 2016. Disponível em: https://izajolp.springeropen.com/articles/10.1186/s40173-016-0071-z

8º – DOSI, G.; PEREIRA, M. C.; ROVENTINI, A.; VIRGILLITO, M.E. The Effects of Labour Market Reforms upon Unemployment and Income Inequalities: an Agent Based Model. Texto para discussão N. 328. Instituto de Economia da UNICAMP. Campinas, março de 2018. ISSN 0103-9466