Pular para o conteúdo principal

Artigo – Breve reflexão sobre a roupa nova da CPMF

Imagem
Arquivo de Imagem
Imagem do site Recontaai.com.br

Imagem: Agência Brasil

O apoio da mídia à gestão (e aos princípios) de Paulo Guedes, mesmo quando execra o governo Bolsonaro, vem rendendo algumas posições curiosas e saias justas. O ITF (Imposto sobre Transações Financeiras) é o melhor exemplo.

Embora a grita não seja a mesma de quando o governo Dilma resolveu ressuscitar a CPMF, o ITF de Guedes ainda não é aceito sem reservas. Ali em 2015, como era de se esperar, quem mais reclamava eram os que menos pagavam, havia a resistência natural a impostos (sempre baseada mais em princípios do que em possíveis perdas) e uma campanha atroz da mídia que agora se mostra indecisa. Mais do que em dúvida, as emissoras adotaram o silêncio e a baixa repercussão sobre a medida. Podemos até dizer que aderiram a uma campanha low profile.

Comentaristas da Globonews produziram alguns muxoxos. Nada mais que isso. Nem perto da fúria com que atacaram a proposta de volta da CPMF no final do período Dilma. No entanto, o presidente da Câmara já se posicionou contra o ITF e alguns comentaristas econômicos o acompanham, sempre com a crítica de que é um imposto acumulativo e regressivo, que prejudica a produção. Essa alegação e as costumeiras, mais ideológicas – o presidente se elegeu praticamente incentivando a sonegação e prometendo retirar qualquer obstáculo da vida dos empresários – são as que predominam nas críticas ao ITF, seja por parte do presidente da Câmara ou entre os comentaristas econômicos.

No entanto, a promessa é que o imposto viria para compensar a desoneração dos empresários na folha de pagamento. Desonerar ainda mais, que seja bem dito. A justificativa dessa desoneração é que abriria os caminhos para a geração de novas vagas de trabalho. Diminuiria-se as contribuições patronais para o FGTS, para o Sistema S e para o INSS. Tudo sob a égide do lema “menos Estado, mais liberdade”.

É claro que essa reforma tributária, alegadamente se dando em função de uma política de crescimento, mereceria mais discussões com a sociedade. Mas o que impressiona neste debate, até o momento, são suas premissas. Discute-se possíveis aumentos da carga final de tributos patronais. Contas estão sendo realizadas para verificar se haverá ganhos ou prejuízos do empresariado. Não se discute se a diminuição do FGTS representa menos dinheiro na conta do trabalhador, se a redução na carga do INSS afetará a Previdência, nem mesmo se a diminuição da contribuição para o Sistema S irá prejudicar a oferta de formações profissionalizantes e especializadas.

Outro dado tido como irrefutável é que a desoneração de encargos e tributos patronais é um caminho natural para a retomada de crescimento e geração de empregos. Ora, como já frisou recentemente o economista Sérgio Mendonça, “já houve desoneração desde 2015 e não houve geração de empregos. Esse é um velho debate da teoria econômica. Na minha visão, o que gera emprego é demanda – consumo e investimento – e crescimento econômico”.

Ainda assim, a redução dos custos trabalhistas parece ser um dogma: é um desafio encontrar algum jornalista econômico, nas tevês ou nas rádios, cuja análise não parta dessa “necessidade” patronal. A visão – e as necessidades – do trabalhador não fazem parte dos comentários da grande mídia. Nem das falas governamentais. Nem da revolta de Rodrigo Maia. A constatação de que a desoneração só gerou ganhos privados para o empresariado e não contribuiu em nada para a geração de empregos ou aumento na produção pode ser óbvia, mas não merece uma fala sequer nos noticiários.

Quanto a investimentos públicos, até mesmo economistas conservadores andaram se manifestando favoravelmente há dois meses, ganhando inclusive espaço em canais e redes sociais da esquerda, onde foram incensados. Durou pouco essa insistência. Foi murchando após duas ou três falas de Guedes sobre o sagrado equilíbrio das contas públicas.

Por fim, mais uma breve comparação entre a antiga CPMF e a sua nova versão. Ali a justificativa era a destinação dos tributos para a área da Saúde. Aqui a ideia é de arrecadar para compensar a crescente desoneração patronal. Uma motivação muito mais nobre, já que não se trata, desta vez, de despesas sociais. Afinal, saúde é uma área em que a iniciativa privada poderá dar conta em breve. E, como temos visto nesses dias, nem é tão importante assim. Já libertar o empresariado do jugo opressor dos trabalhadores… Ah, isso urge. Deve ser a correção de alguma injustiça histórica.

Por Maurício Falavigna, historiador