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Ação de Padre Júlio Lancellotti inspira projeto de lei contra ‘arquitetura hostil’

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Imagem do site Recontaai.com.br

Ao lutar contra uma obra pública a marretadas, Padre Júlio Lancellotti inspirou parte da sociedade, e até o Senado, contra a arquitetura hostil

Um padre idoso empunhando uma bengala em uma mão e uma marreta em outra. Essa foi mais uma das cenas inacreditáveis ocorridas no Brasil durante a pandemia de Covid-19.

Ao contrário do que parece, a ação do Padre Júlio Lancellotti não foi agressiva: foi uma reação à violência institucional, à “arquitetura hostil”.

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Arquitetura hostil ou arquitetura defesiva são conceitos atribuídos às construções urbanas que buscam repelir a população. Segundo o arquiteto e urbanista Pedro Ekman, são dispositivos urbanos desenhados para impedir a proteção de quem não tem outra opção “para se refugiar da chuva e do frio”. Ele explica que tais dispositivos se dedicam a negar que a arquitetura realize sua função mais primordial, que é a de ser um abrigo.

Confira o comentário do Padre Júlio Lancellotti

“A arquitetura hostil é uma atitude que rejeita, uma atitude que impacta, uma atitude que torna a pessoa que vive pelas ruas um refugiado urbano”.

Padre Júlio Lancellotti

A cultura das cidades

Para o Padre Júlio Lancellotti, a arquitetura das cidades é um sinal que mostra se ela é acolhedora ou não. “Uma cidade que tem uma arquitetura hostil mostra que tem uma cultura hostil”, ressalta.

Em outras palavras, esse tipo de arquitetura é uma anti-arquitetura, que transforma cidades em anti-cidades. É uma negação do espaço público. “O que motiva esse desenho é a realização mais declaradamente fascista da construção de uma cidade que não permite a existência do outro”, opina o arquiteto Pedro Ekman.

O projeto de lei baseado no trabalho do Padre Júlio Lancellotti

A marreta de Padre Júlio Lancellotti e sua cruzada contra a arquitetura que penaliza os mais vulneráveis virou o símbolo de uma luta. Uma luta que chegou ao Senado Federal pelas mãos do senador Fabiano Contarato (Rede/ES).

Contarato apresentou ontem (2) um projeto de lei visando incluir no Estatuto das Cidades a proibição à arquitetura defensiva. Nesse sentido, o PL 488/2021 visa coibir o uso de pedras, grades ou outras modificações arquitetônicas em todas as cidades do País.

Júlio Lancellotti considera que apesar de “muito bom”, o projeto de lei não é fruto apenas de suas ações: “É um projeto de lei que quer tornar a cidade mais acolhedora e sem sinais de hostilidade e que tenha lugar para todos”, comenta.

Especulação imobiliária e direito à existência

De acordo com a justificativa do projeto de lei, a arquitetura defensiva existe como forma de retirar de um local uma população indesejada. Isso é feito para valorizar uma região. Ou seja, retira-se o direito de existência de seres humanos para aumentar o preço de mercado dos imóveis.

Sobre isso, o senador afirma: “A raiz do problema está na pobreza, na marginalização e na falta de moradia digna. Tirar pessoas vulneráveis do alcance da vista não resolve tais problemas. Pelo contrário, aprofunda ainda mais a desigualdade urbana”.

O senador prossegue em sua justificativa: “Não bastassem a invisibilidade e as mazelas sofridas pelas pessoas em situação de rua, que hoje totalizam cerca de 222 mil pessoas no Brasil, o Estado, sob pressão do capital financeiro, tenta removê-los até mesmo de um lugar em que se abrigam da chuva”.

Como chegamos a esse ponto?

Pedro Ekman afirma que a ‘arquitetura anti-gente’ só encontrou espaço para ser proposta na cidade porque o fascismo já estaria convivendo na vida das pessoas. “A ideia que está por trás dessa lógica neoliberal é a de que a remoção do público indesejado em determinada localidade resulta na valorização de seu entorno”.

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Com informações da Agência Senado.